quarta-feira, 19 de novembro de 2008

A mídia estatal

Acostumada a viver num país com diversos meios de comunicação, internet livre e redes de televisão com programação variada foi estranho ter poucas notícias do mundo durante os dez dias que passei em Havana, capital de Cuba. O governo comunista dos irmãos Fidel e Raúl Castro (atual presidente do país) controla todos os meios de comunicação da ilha e os veículos são basicamente usados para divulgar o pensamento do estado e informações sobre serviços para a população. Até as notícias policiais são relatadas com o retrato falado ou fato de um suspeito com um apelo para que a população ajude a encontrá-lo.

No tempo em que estive lá, no começo deste mês de novembro, um furacão chamado Paloma passou pelo centro e parte oriental do país e a toda hora as redes de televisão, rádios e jornais falavam sobre o assunto. Dias antes, as notícias eram voltadas a informar as previsões sobre o fenômeno, como se proteger e o que o governo estava fazendo para evitar os danos. Dias depois, a cobertura sobre a tragédia trazia casas, plantações, escolas, cidades destruídas e a população em lágrimas, mas aliviada por ninguém ter morrido.

Há poucas notícias sobre fatos que ocorreram no país, o hard news dos jornais. Na ilha, até os outdoors são usados para enaltecer o governo e agredir quem é contra ele. O alvo, invariavelmente, são os EUA. As matérias, que não são de serviço, têm forte cunho opinativo do pensamento do governo e muitas possuem uma estrutura parecida com a de um artigo. As informações sobre outros países, em geral, são divulgadas em forma de notas. As mais importantes, como o resultado da eleição americana, por exemplo, ganham mais espaço. O maior jornal do país, o Granma, veicula artigos de Fidel Castro periodicamente e, assim, a população continua acompanhando os pensamentos do ex-presidente.

Os canais de televisão na ilha também são mais voltados para matérias de serviço e destinam uma boa parte da transmissão a programas oficiais do governo, educativos e de entretenimento com novelas brasileiras, cubanas, de outros países latinos e até seriados americanos.



A internet tem acesso restrito e controlado no país. Muitos cubanos possuem aparelhos de rádios e antenas parabólicas “clandestinos” que conseguem captar emissoras americanas em língua espanhola e usam isso para poder ter mais informação. Uma vizinha da casa na qual fiquei, sempre nos atualizava com as notícias de fora da ilha. Um dia ela nos confessou que ouvia as notícias num radinho de pilha “clandestino”. Cubanos não podem ouvir emissoras de outros países.

Na ilha há um canal de televisão, também estatal, voltado para turistas e diplomatas, o Cubavisión Internacional, com notícias internacionais e da programação cultural do país, mas só poder ser visto por quem tem TV a cabo, o que não é permitido para cubanos.

A qualidade das transmissões e dos veículos impressos também foi abalada pela crise que o país enfrenta desde o fim da União Soviética que garantia os suprimentos que o país deixou de ter com o embargo internacional. Os jornais são em formato tablóide, possuem poucas páginas (é caro importar papel) e o número de veículos foi reduzido no final da década de 80. Na televisão, há muitos programas estrangeiros porque a produção local não consegue cobrir o tempo de programação diária. A pesquisadora Carola Saavedura Hustado fez sua dissertação de mestrado, em uma universidade alemã, sobre a situação da mídia em Cuba. Leia um artigo dela sobre o assunto.

O controle da mídia pelo governo cubano determina o que a população deve saber e de que forma o fato deve ser transmitido. Isso restringe o acesso à informação, funciona como instrumento de manipulação da opinião pública e não permite um jornalismo imparcial e apartidário. Deve ser complicado trabalhar como jornalista numa situação deste tipo... No entanto, como tudo tem dois lados, no caso de Cuba, o positivo é o fato de a imprensa ser bem usada para informar a população sobre serviços essenciais e educar por meio dos telecursos.

***Esse post se restringe à situação dos meios de comunicação em Cuba e não pretende julgar o regime político do país. Isso renderia outra discussão muito mais longa.

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